sábado, 15 de junho de 2013

Parcerias Público-Privadas



As parcerias público-privadas (PPP) são associações entre o Estado e as empresas privadas tendo em vista a execução de um equipamento de interesse público.

Não tendo o Estado condições para executar determinadas obras públicas, pede a um privado para fazer por ele e paga a esse mesmo privado concedendo-lhe a exploração durante um determinado tempo, que na maior parte varia entre 30 a 40 anos. No final desse tempo, pode acontecer dois cenários: ou o Estado recupera esse mesmo equipamento e passa a ser o total detentor; ou faz uma renovação da parceria para continuar a explorar.

Auto-estradas, hospitais, sistemas de abastecimento de água, são alguns exemplos de infra-estruturas construídas e geridas em parceria com o sector privado.

As primeiras PPP foram criadas no Reino Unido na década de 1990. A primeira PPP portuguesa surgiu em 1992, com a construção da Ponte Vasco da Gama em Lisboa. Desde então, tornamo-nos o campeão europeu das PPP:

  • Portugal aparece destacado no topo da lista com 1.559 mil milhões de euros de empréstimos, seguido da França com 467 mil milhões de euros -.
  • Os 5 países seguintes na lista todos juntos somam 1.381 mil milhões de euros de empréstimos, ou seja, menos que o conjunto dos empréstimos do Estado português para as PPP.
Ao longo de anos, sucessivos governos assinaram contractos em que garantiram rentabilidades milionárias para os grandes grupos económicos (Grupo Mello, Grupo Espírito Santo, Mota-Engil, Soares da Costa), Numa “boa” PPP o privado arrisca, investe e fica com os lucros da exploração ou, se as coisas correrem mal, com os prejuízos. Nas PPP portuguesas, o risco dos privados é zero e o risco para os contribuintes é total. Os privados ficam com o lucro e sem risco, o estado fica sem o lucro e com o risco.

Se não há trânsito nas antigas Scut, devida uma taxa de disponibilidade diária criada em Maio de 2010, independentemente do tráfego existente há um rendimento garantido na ordem dos 15 por cento. Renegociação em que as portagens ficaram 58 vezes mais caras ao estado. As receitas das portagens para o Estado são de 250 milhões ( com tendência para descer face à quebra de carros a circular ), em contrapartida paga uma renda às Estradas de Portugal de 650 milhões de euros. Quem paga o prejuízo? Os portugueses.

Se as taxas de juro sofrem variações, o Estado indemniza, como aconteceu com a ponte Vasco da Gama, com compensações da ordem das dezenas de milhões. 

Um outro exemplo extraordinário, revelador de gestão danosa dos dinheiros públicos, é a de uma fórmula de cálculo inserida no contrato de uma PPP, numa auto-estrada em Viana do Castelo, em que o concessionário paga multas, ou recebe prémios do Estado, em função da taxa de sinistralidade. Se a sinistralidade aumentar 10%, o concessionário tem de pagar uma multa de 600 mil euros, mas, se houver uma redução de 10% na sinistralidade, o Estado tem de pagar à empresa 30 milhões de euros.

Deste modo, os governantes apresentam obras para serem eleitos e o contribuinte paga os encargos do estado que comprometem as finanças públicas por toda uma geração e hipotecam o futuro da economia do país. Nos últimos quatro anos, os encargos líquidos com as PPP quadruplicaram, atingindo por ano montantes da ordem dos dois mil milhões de euros. O valor dos compromissos futuros estima-se em mais de 24 mil milhões de euros, cerca de 15% do PIB anual.

Foram criadas sem estudos legais e técnicos prévios sobre a associação entre o Estado e os interesses privados, definindo-se assim:
  • o Estado  entra com o grosso dos capitais necessários à exploração (e por vezes também a União Europeia)
  • o custo final das obras públicas ultrapassa sempre 4 a 12 vezes o custo orçamentado, sendo o Estado quem entra com os capitais em falta, endividando-se
  • as concessões assentam sempre em pressupostos irrealistas (por exemplo, o número de veículos que irá passar numa ponte ou numa auto-estrada) mas garantidos pelo Estado, que tem de pagar uma renda para compensar o défice de tráfego, os atrasos na construção, etc
  • a falta de partilha efectiva de riscos entre o parceiro público e o parceiro privado ou o desequilíbrio na assunção de riscos
  • o défice de monotorização e fiscalização pelo Estado da execução dos contractos de parceria.
Os contractos das parcerias público-privadas portuguesas caracterizam-se, deste modo, pela opacidade, ilegitimidade, inconstitucionalidade, arbitrariedade e abuso de poder, em benefício dos interesses privados e em prejuízo do bem público. Revelaram-se negócios ruinosos para o Estado e extremamente vantajosos para os grandes grupos económicos que fizeram um investimento sem assumir riscos, já que as sobreavaliadas rendas anuais, a pagar pelo Estado, estão garantidas por contrato.

Para piorar o cenário, e perante as exigências da Troika na renegociação dos contractos das PPPs, o actual governo veio rapidamente publicar um decreto-lei onde garante aos privados das referidas parcerias lucros fabulosos para sempre "da aplicação do presente diploma não podem resultar alterações aos contractos de parcerias já celebrados, ou derrogações [anulações] das regras nelas estabelecidas, nem modificações a procedimentos de parceria lançados até à data da sua entrada em vigor."

Curiosidades, ou talvez não:
  • os principais responsáveis pelas PPP ( ex. ministros e secretários de estado) acabam por ir para as empresas privadas das parcerias.
  • os consultores, advogados e juristas contratados pelo Estado para elaborar, não só a legislação que enquadra as PPP, como os próprios contractos, trabalham maioritariamente nas empresas privadas das parcerias.
Já foi caracterizada como a história de um grande conluio entre alguns políticos, bancos, construtoras, consultoras e grandes gabinetes de advogados. 

Afastada pelo actual governo a possibilidade de renegociação dos contractos, as soluções mais defendidas pelos especialistas passam por:
  • Expropriação por utilidade pública dos equipamentos. Determinação do valor de expropriação obtém-se através duma avaliação independente do valor das infra-estruturas. As rendas pagas aos financiadores da nova operação estima-se que serão na ordem de metade das que hoje são pagas aos concessionários.
  • Alteração do modelo de contratação, que consistiria em converter as concessões em contractos de exploração. Sem quaisquer garantias para os privados, estes deverão partilhar as receitas, de forma justa, a troco do alargamento do período de concessão. Desta forma, o Estado ainda teria lucro.
Concluo, recordando uma frase de Miguel Sousa Tavares ao Expresso em 07 de Janeiro de 2006:
«Todos vimos nas faustosas cerimónias de apresentação dos projectos [Ota e o TGV], não apenas os directamente interessados - os empresários de obras públicas, os banqueiros que irão cobrar um terço dos custos em juros dos empréstimos - mas também flutuantes figuras representativas dos principais escritórios da advocacia de negócios de Lisboa. Vai chegar para todos e vai custar caro, muito caro, aos restantes portugueses. E o grande dinheiro agradece e aproveita

e, com uma expressão de Wael Ghonim, que para mim representa a única solução para acabar com toda a podridão que paira no n/ Sistema : “o poder do povo é muito mais forte do que o povo no poder”.

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